segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Enfermagem & Acupuntura

 

✜  Enfermagem é a arte ou técnica de realizar tratamentos (cure / 治愈 - zhìyù) prescritos por médicos a doenças específicas ou prestar cuidados contínuos (care / 關心 - guānxīn) aos seres humanos enfermos, feridos, deficientes e moribundos. Seus cuidados tanto podem destinar-se a indivíduos como famílias e comunidades. Há quem atribua sua origem, enquanto conhecimento científico, à Florence Nightingale (1820-1910) militante da caridade e causa social inglesa, estaticista e autora de um dos primeiros livros da enfermagem moderna ("Notes on nursing", 1869). [1] Contudo não se pode descartar a hipótese de origem dessa profissão, nos curandeiros(as), religiosos (as), nas parteiras, doulas e pré-históricos práticos encarregados da redução de fraturas. [2] [3] Profissões que ainda persistem na medicina folk (popular / tradicional e/ou são especialidades  da  medicina  e enfermagem.

Em chinês enfermagem (護理 - hùlǐ) pode ser escrita com a combinação dos ideogramas de (lǐ) razão ou ciência e (hù) proteger (também grafado ) ou ainda  护理学 (hùlǐ xué) enfermagem, "o constante aprendizado da ciência do proteger ou cuidar", numa tradução literal.. O ideograma correspondente à cura - zhìyù  (治愈) é compostos pelos signos de regra - zhì  () e  saúde -  yù () e o correspondente a cuidar - guānxīn ( 關心), que também significa preocupar é composto pelos ideogramas () guān - desligar   e () – xīn  que corresponde a  sentir ou a o coração.


Uma pesquisa realizada com enfermeiras (capacitadas em medicina ocidental) numa clínica de acupuntura em Chengdu, China [4] revelou que sua função permanecia igual como no ocidente, sendo auxiliares do médico durante o agulhamento. Os resultados, das entrevistas combinadas com observações "in loco", mostrou também  que as enfermeiras eram responsáveis por muitos dos procedimentos técnicos não invasivos, a exemplo, do uso de  ventosa. Todas as enfermeiras do estudo foram treinadas em medicina ocidental com dito e o treinamento possuíam da  Medicina Tradicional Chinesa (MTC) , incluindo acupuntura, foi adquirido através do médico especializado em acupuntura que trabalhava nessa clínica.  Naturalmente que esta não é a condição de todas as enfermeiras em hospitais e clínicas chinesas.

 Acupuntura uma prática e modelo que se difunde

Dorothy C. Sherwin, do Northeast Wisconsin Technical College [5]  considera promissor  o treinamento de profissionais de enfermagem em MTC. Nesse treinamento tais profissionais  têm a oportunidade de aprender as nuances do ambiente oriental e integrá-las em suas habilidades para cuidar do espírito, da mente e do corpo dos pacientes de maneira holística.

Segundo Souza,...no Reino Unido os acupunturistas tradicionais atuam sem possuir uma graduação, utilizam a acupuntura como terapia principal e se submetem, geralmente, às normas das associações voluntariamente constituídas. Aqueles que exercem a acupuntura com base em um treinamento específico, feito após a graduação em outras áreas das ciências biomédicas, como fisioterapia, enfermagem, medicina, utilizam essa arte como parte de sua profissão, como mais uma técnica entre as diversas possíveis e, por isso, ficam submetidos à regulação estatal de suas profissões principais... [6]

Nos Estados Unidos da América do Norte a Comissão Nacional de Credenciamento para Escolas e Faculdades de Acupuntura e Medicina Oriental (NACSCAOM - National Accreditation Commission for Schools and Colleges of Acupuncture and Oriental Medicine) já aprovou mais de 50 escolas e faculdades de acupuntura e medicina oriental. Para formação de um profissional é exigido um mínimo de 1.725 horas de treinamento, com 360 horas dedicadas a cursos biomédicos ocidentais (que podem ser dispensadas para profissionais de saúde com evidências de aprovação nesses cursos durante o estudo anterior) e 1.365 horas dedicadas à teoria, técnica e prática clínica da acupuntura. [7]

Como nem todos os estados americanos têm os mesmos requisitos para autorização da pratica da acupuntura, o grau de educação e treinamento dos profissionais médicos que realizam a acupuntura varia. Trinta e cinco estados permitem que os médicos pratiquem a acupuntura sem regulamentação, por ser considerada dentro do escopo de suas licenças de médicas ou osteopatas. No Alasca e em Iowa, podólogos e dentistas podem praticar a acupuntura em seus âmbitos de prática. Connecticut permite que enfermeiras realizem acupuntura sob as ordens de um médico sem nenhum treinamento específico. Alguns estados também permitem que os quiropráticos pratiquem a acupuntura após 100 horas de instrução. Kansas permite que assistentes médicos agulhem pacientes, se autorizados por um médico. [7]

Na França, curiosamente, onde o diplomata (não médico) George Soulié de Morant (1878 -1955) foi um dos precursores da introdução da acupuntura no ocidente, ao contrário de outros países europeus, a prática da acupuntura e, mais especificamente, da medicina chinesa é reservada apenas aos médicos. Recentemente uma enfermeira de 62 anos, foi processada por exercício ilegal da medicina, condenada a pagar uma multa de 2.000 euros e teve suspensa direitos  profissionais suspensos. Sua formação em medicina tradicional chinesa de três anos, ocorreu na própria França e Vietnã. [8]

No Brasil O Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) reconhece a acupuntura como especialidade dentro da enfermagem.[9] . Considerando que a prática da acupuntura tem validade e eficácia, e não contraria a Lei do Exercício Profissional de Enfermagem (LEPE n.º 7.488/1986). O COFEN quando estabeleceu a acupuntura como especialidade, cabendo ao enfermeiro, privativamente ampliar sua capacitação profissional nos horizontes conceituais dos benefícios da técnica da acupuntura tanto para o diagnóstico de enfermagem como nas intervenções específicas (ou seja, a acupuntura não está incluída na grade de disciplinas do curso regular de enfermagem no Brasil e requer especialização).

Alguns pesquisadores ressaltam que apesar de autorizada pelo COFEN, e por relativa presença de sua utilização como prática holística e/ou complementar integrativa, no Brasil há restrições a prática da acupuntura na enfermagem em algumas instituições [10] [11] [12]

Contudo pode-se afirmar que há consenso de expertises em diagnósticos de enfermagem e intervenções em acupuntura quanto a aplicação da técnica nos cuidados e diagnósticos de enfermagem. [13] [14] [5] Observando-se porém a demanda de desenvolvimento de mais estudos teóricos e práticos para sua fundamentação e aplicação a problemas específicos, tipo dor crônica, artrose, infertilidade, transtornos da gravidez, obesidade etc.  (o que não é uma recomendação à pratica da acupuntura na enfermagem e sim a alguns supostos efeitos de eficácia da acupuntura em si independente de quem o pratique) [13] [16] [17] [18] [19]

Observe-se que o esforço de pesquisas para comprovação científica e eficácia terapêutica da acupuntura e outros aspectos da medicina chinesa ocorre em paralelo à disputa pelo estabelecimento do monopólio de sua prática. Segundo Nascimento [20] a controvérsia entre médicos e não-médicos parece ser expressão tanto da disputa no campo do saber e mais precisamente da autoridade cultural, que na cultura ocidental tende a ser identificada à ciência, como no campo do mercado, ambos concorrendo para a consolidação do processo de profissionalização da acupuntura no Brasil.

 Referências

1 - Encyclopædia Britannica. Nursing, medical profession, BUHLER-WILKERSON, Karen (https://www.britannica.com/science/nursing) ;  SELANDERS, Louise. Florence Nightingale, British nurse, statistician, and social reformer (https://www.britannica.com/biography/Florence-Nightingale) Acesso em agosto de 2020 / Bbarcelona: La Sal, 1981

2 – EHRENREICH, Barbara; ENGLISH,Deidre. Brujas, parteras e enfermeras, una historia de sanadoras. NY: Glass Mountain Pamphlet, Feminist Press, 1973

 3 - Shady Grove Orthopaedics. Hystory of orthopaedics. Washington, DC: https://shadygroveortho.com/history-of-orthopaedics/ Aces. Agosto de 2020


4 - RISLUND, S. (2016).Nurses’ Conception of their Role in Acupuncture Therapy in a Clinic in Chengdu, China : An empirical study investigating the nurses’ role in a Chinese setting (Dissertation). Retrieved from http://urn.kb.se/resolve?urn=urn:nbn:se:kau:diva-42644 PFF Aces. Agosto de 2020

5 - SHERWIN, D. C. (1992). Traditional Chinese Medicine in Rehabilitation Nursing Practice. Rehabilitation Nursing, 17(5), 253–255. doi:10.1002/j.2048-7940.1992.tb01560.x url to share this paper: sci-hub.tw/10.1002/j.2048-7940.1992.tb01560.x Aces. Agosto de 2020

6 - SOUZA, Rodolfo Costa A regulamentação da acupuntura no direito comparado. Câmara dos Deputados / Consultoria Legislativa, Julho de 2009 https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/estudos-e-notas-tecnicas/publicacoes-da-consultoria-legislativa/areas-da-conle/tema19/2009_4931.pdf Aces. Agosto de 2020

7 - ELITE. Acupuncture Essential for Nurse Practitioners https://www.elitecme.com/resource-center/nursing/acupuncture-essential-for-nurse-practitioners/ Aces. Agosto de 2020

8 - ActuSoins, 6 mai 2015. Acupuncture : une infirmière condamnée pour exercice illégal de la médecine https://www.actusoins.com/262991/acupuncture-une-infirmiere-condamnee-pour-exercice-illegal-de-la-medecine.html

7 - COFEN – Conselho Federal de Enfermagem RESOLUÇÃO COFEN N°585 de 08/08/2018 https://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-no-585-2018_64784.html Acesso 23/08/2020

9 - KUREBAYASHI, Leonice Fumiko Sato; OGUISSO, Taka; FREITAS, Genival Fernandes de. Acupuntura na enfermagem brasileira: dimensão ético-legal. Acta paul. enferm. , São Paulo, v. 22, n. 2, pág. 210-212, 2009. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-21002009000200015&lng=en&nrm=iso>. acesso em 21 de agosto de 2020. https://doi.org/10.1590/S0103-21002009000200015

10 - KUREBAYASHI, Leonice Fumiko Sato; FREITAS, Genival Fernandes de; OGUISSO, Taka. “Acupuntura na saúde pública: uma realidade histórica e atual para enfermeiros”. Cultura de los cuidados. Año XIII, n. 26 (2. semestre 2009). https://rua.ua.es/dspace/bitstream/10045/13510/1/CC_26_05.pdf  ISSN 1138-1728, pp. 27-33

11 - DA SILVEIRA, Rodrigo Euripedes et al. La acupuntura como herramienta de trabajo para las enfermeras: revisión de la literatura. Cultura de los cuidados, [S.l.], n. 35, p. 96-105, mayo 2013. ISSN 1699-6003. Disponible en: <https://culturacuidados.ua.es/article/view/2013-n35-acupuntura-como-instrumento-de-trabalho-do-enfermeiro-revisao-integrativa-da-literatura>. Fecha de acceso: 23 ago. 2020 doi:https://doi.org/10.7184/cuid.2013.35.09.

12 -PEREIRA, Raphael Dias de Mello; ALVIM, Neide Aparecida Titonelli. Acupuntura para intervenção de diagnósticos de enfermagem: avaliação de experts e especialistas de enfermagem. Esc. Anna Nery, Rio de Janeiro , v. 20, n. 4, e20160084, 2016 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-81452016000400203&lng=en&nrm=iso>. access on 21 Aug. 2020. Epub Aug 25, 2016. http://dx.doi.org/10.5935/1414-8145.20160084

13 - GRIFFITHS V, TAYLOR B. Informing nurses of the lived experience of acupuncture treatment: a phenomenological account. Complement Ther Clin Pract. 2005;11(2):111-120. doi:10.1016/j.ctnm.2004.09.003

14 - PEREIRA, Raphael Dias de Mello; TITONELLI ALVIM, Neide Aparecida. Acupuncture in care: an integrative review of scientific production of brazilian nurses. Journal of Nursing UFPE on line, [S.l.], v. 7, n. 7, p. 4849-4858, may 2013. ISSN 1981-8963. Available at: <https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/view/11743>. Date accessed: 23 aug. 2020. doi:https://doi.org/10.5205/1981-8963-v7i7a11743p4849-4858-2013.

15 - Hao Y, Jiang J, Gu X. Traditional Chinese medicine and nursing care. Int J Nurs Sci. 2017;4(3):328-329. Published 2017 Jun 17. doi:10.1016/j.ijnss.2017.06.005

16 - FRANCO SÁNCHEZ, Jesús; CAMACHO ALCÁNTARA, José Antonio; BEGINES ALONSO, Rocío. Manejo del dolor crónico con acupuntura por la enfermera en atenció n primaria en pacientes diagnosticados de gonartrosis. Biblioteca Lascasas, 2017; V13. Disponible en <http://www.index-f.com/lascasas/documentos/e11307.php>

17 - OLIVEIRA, Cristiane Araújo de Acupuntura e enfermagem: inovar o atendimento humanizado e integral ao paciente. Sociedade Brasileira de Reprodução Humana. Publicações on -line Nov. 2017 https://enfermagem.sbrh.org.br/wp-content/uploads/2017/11/Acupuntura.pdf Acesso em Agosto de 2020

18 - SEBOLD, Luciara Fabiane; RADUNZ, Vera; ROCHA, Patrícia Kuerten. Acupuntura e enfermagem no cuidado à pessoa obesa. Cogitare Enfermagem, [S.l.], v. 11, n. 3, dec. 2006. ISSN 2176-9133. Disponível em: <https://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/7329>. Acesso em: 23 aug. 2020. doi:http://dx.doi.org/10.5380/ce.v11i3.7329.

19 - MARTINS, Eveliny Silva et al . Nursing and advanced acupuncture for relief of low back pain during pregnancy. Acta paul. enferm., São Paulo , v. 32, n. 5, p. 477-484, Oct. 2019 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-21002019000500003&lng=en&nrm=iso>. access on 23 Aug. 2020. Epub Oct 10, 2019. https://doi.org/10.1590/1982-0194201900067.

20 - NASCIMENTO, Marilene Cabral do. De panacéia mística a especialidade médica: a acupuntura na visão da imprensa escrita. Hist. cienc. saude-Manguinhos,  Rio de Janeiro ,  v. 5, n. 1, p. 99-113,  June  1998 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59701998000100005&lng=en&nrm=iso>. access on  24  Aug.  2020.  https://doi.org/10.1590/S0104-59701998000100005.


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VER TAMBÉM

National Accreditation Commission for Schools and Colleges of Acupuncture and Oriental Medicine NACSCAOM https://www.nccaom.org/

 WHO- World Health Organization. Health topics/Traditional medicine https://www.who.int/westernpacific/health-topics/traditional-complementary-and-integrative-medicine

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NOTA

apesar da Wikipédia em anos recentes vir conduzindo um beligerante debate contra o que considera pseudociência no âmbito das ciências saúde, o que praticamente abrange as PICS - Práticas Integrativas e Complementares, como são denominadas no Brasil, ainda se constitui como uma possibilidade de diálogo, conhecimento e discussão sobre tais práticas, antes conhecidas como Medicina Alternativa. 

Participe desta série de verbetes dos quais sou também editor de sua construção e discussão:

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