Esse conjunto de anotações
integra a revisão sistemática da tese que considera o sistema de pontos e
meridianos da acupuntura e por extensão o conjunto de chakras ou cakras, que é
a forma romanizada do vocábulo (चक्र cakra) em sânscrito, como as primeiras representações do que hoje nós compreendemos como sistema
nervoso com suas formas, funções e patologias.
Apesar da referida proposição
se deter no sistema etnomédico ou medicina tradicional chinesa não é possível
ignorar a relação entre as concepções indiana e chinesa com as suas promissoras
aplicações que vem sendo reconhecidas em todo mundo desde meados do século XX.
Destacamos aqui os estudos e
intervenções de Svoboda e Lade (no livro Tao e Dharma, 1995) que explora as
semelhanças e diferenças desses dois sistemas etnomédicos, e intervenções
clínicas de Gabriel Stux, publicadas entre outras edições no Medical
Acupuncture, 1994. Gabriel Stux inclui na aplicação tradicional de agulhas da acupuntura
as concepções do sistema indiano de chakra para diagnose das patologias e
escolha do tratamento. Na pesquisa de Svoboda e Lade, na ilha, quase indiana, de
Sri Lanka (Ceilão), com forte influência chinesa, que se estendeu a médicos
tradicionais tratadores de elefantes e textos clássicos, eles constataram que
apesar das doutrinas chinesas e indianas partilharem de temas comuns (destaca
as semelhanças entre Chi e Prana), elas são essencialmente únicas, e seus
conceitos não podem ser intercambiados na totalidade.
A escolha da análise da tese
de Mircea Eliade (1907-1986) se deve não somente à pertinência do tema Chakras, mas
também a excelência da metodologia empregada por ele para obter uma melhor
compreensão de uma medicina ou espiritualidade exótica sem nos limitarmos a
nossa própria orientação cultural. Sua tese sobre as doutrinas do Yoga,
destinada a historiadores de religiões, psicólogos e filósofos (como ele a
definiu) foi apresentada na Universidade da Romênia, (1932-1936) na cadeira de
filosofia e filologia, foi posteriormente adaptada para livro (Chicago, 1967)
com o nome de “Yoga, imortalidade e liberdade” de cuja tradução de Teresa
Barros Velloso para o português extraímos aqui as descrições da concepção de
chakra/ cakra, orientados pelas notas e índice remissivo da edição (1972/1996).
Sem o apoio das disciplinas da
história e linguística, como evidencia em seu trabalho (e estudo do sânscrito e
filosofia por quatro anos (1928-1931) na Universidade de Calcutá não teríamos
obtido resultados tão precisos. A ênfase em linguística desenvolvida por ele se
deve inclusive a natureza do sânscrito em sua relação aos idiomas europeus
despertados pela filologia comparada indo ariana.
No caso da tese que estamos
desenvolvendo sobre as representações “primitivas” do que hoje nós compreendemos como sistema nervoso, a nossa
maior demanda não recai sobre a barreira linguística do entendimento de um
conjunto de ideogramas chineses. Nossa maior dificuldade são as relações destes
com a nomenclatura das patologias e disfunções do sistema nervoso
historicamente identificadas tanto em nossa medicina ocidental como no sistema
etnomédico chinês. Do mesmo modo que Eliade temos a análise do processo
histórico de ambos os sistemas como guia, sendo que nossa ênfase é a antropologia
médica.
Nesse presente texto
recortamos da valiosa contribuição de Eliade, que além de sua metodologia
histórico-filológica, nos trouxe, de forma clara, a noção de que os chakras
possuem relação com os plexos nervosos e qual a natureza desta relação, onde se inclui as noções de sono, sonho e demais estados de consciência, tão relevantes para a moderna neurociência. Os plexos nervosos ou plexos raquídeos, são conjuntos de nervos motores
sensitivos ou mistos, que contém por sua vez, fibras motoras ou sensitivas e tem
uma distribuição fixa em um território próprio. Tais raízes ou troncos e ramos se entrelaçam e
formam territórios distintos de sua raiz raquidiana e troncos nervosos,
geralmente na forma de bandas organizadas paralelamente recordando sua
disposição metamérica em zonas. (Testut, Latarjet p.219)
Analisando os estudos sobre
efeitos fisiológicos do Yoga, Eliade identificou a existência de muitos métodos
hatha-yóguicos para se obter
resultados semelhantes, supondo que alguns de seus praticantes se
especializaram em técnicas fisiológicas, mas outros (a maioria) seguiu a
tradição milenar de uma fisiologia mística. Segundo ele pode afirmar que o
cormo construído pelos Hatha-yoguis, os tantristas e alquimistas (que analisa
em sua tese juntamente com as concepções Budistas, Bramanistas/hinduístas ou xamânicas
dos primitivos aborígenes) descrevem o corpo de um “homem-deus”.
Em suas palavras:
“ De fato, apesar de os
indianos terem elaborado um complexo sistema de medicina científica, nada nos
leva a crer que as teorias da fisiologia mística tenham se desenvolvido na
dependência dessa medicina objetiva e utilitária, ou ao menos vinculadas a ela.
A “fisiologia sutil” formou-se provavelmente a partir de experiências ascéticas,
extáticas e contemplativas, expressas na mesma linguagem simbólica da cosmologia
e do ritual tradicional. Isso não quer dizer que tais experiências não tenham
sido reais: elas eram reais, porém não no sentido em que um fenômeno físico é
real. Os textos tântricos e de hatha-yoga chamam nossa atenção por seu “caráter
experimental”, trata-se, porém, de experiências efetuadas em níveis distintos
dos da vida cotidiana e profana. As “veias”; os “nervos” os “centros” dos quais
falaremos, correspondem sem dúvida a experiências psicossomáticas e estão em
relação com a vida profunda do ser humano, mas não parece que “veias” e termos
semelhantes indiquem órgãos anatômicos e funções estritamente fisiológicas.
Tentou-se, muitas vezes,
localizar anatomicamente essas “veias” e “centros”. Hermann Walter, por
exemplo, acredita que, no hatha-yoga, nādi
signifique “veias”; ele identifica idā
e pingalā com a carótida (loeva et dextra) e brahmarandhra
com a sutura frontal (cf. H.Walter,Svātmārāna’s Hatha-yoga-pradipikā, München,
1893, p. IV, VI e IX).
De
outro lado, a identificação dos “centros”; (cakra) com seus plexos tornou-se
corrente: mūlādhāra-cakra seria o
plexo sagrado; svādhisthāna, o plexo prostático;
manipūra, o plexo epigástrico; anāhata, o plexo faríngeo; ājnā, o plexo cavernoso. Contudo,
basta ler atentamente os textos para perceber que se trata de experiências
transfisiológicas; todos esses “centros” representam “estados yóguicos”, isto é, inacessíveis sem ascese espiritual. As
mortificações e as disciplinas meramente psicofisiológicas não são suficientes
para “despertar” os cakra ou penetrá-los; o essencial, o indispensável,
continua sendo a meditação, a realização espiritual. Assim, é mais prudente
considerar a “fisiologia mística” como resultado e conceituação das
experiências levadas a efeito, esses últimos efetuavam suas experiências em um “corpo
sutil”, isto é, por meio de sensações, tensões, estados transconscientes
inacessíveis aos profanos. Eles dominavam uma zona infinitamente mais vasta que
a zona psíquica “normal”, penetravam nas profundezas do inconsciente e sabiam “despertar”
as nascentes arcaicas da consciência primordial, fossilizadas na maioria dos
seres humanos.
Segue
então os excertos de suas reflexões e descrições dos Cakras.
Segundo a tradição indiana
existem sete cakra importantes que se relacionam com os seis plexos e a sutura
frontal.
1º) Mūlādhāra (mūla
= raiz) está situado na base da coluna vertebral, entre o orifício anal e os
órgãos genitais (plexo sacrococcigiano). Tem forma de lótus vermelho com quatro
pétalas, nas quais estão escritas em ouro as letras v, s, s’, s. . No meio do
lótus um quadrado amarelo, emblema do elemento terra (prthiví), tem no centro um triângulo com o vértice invertido,
símbolo da yoni, chamado kāmarūpa; no
coração do triângulo está svayambhūlinga
(o linga existente por si mesmo), de
cabeça brilhante como uma joia. Enrolada oito vezes (tal como uma serpente) ao
redor de si mesma, brilhante como o relâmpago, dorme kundalini, obstruindo com
a boca (ou cabeça) a abertura do linga. Kundalini
fecha dessa maneira o brahmadvāra
(porta de Brahman) e o acesso à susumnā.
O mūlādhāra-cakra relaciona-se com a
forca coesiva da matéria, a inércia, o nascimento do som, o sentido do olfato, a
respiração apāna, os deuses Indra, Brahmā, Dakīni, Śakti etc.
2º) Suādhisthāna-cakra, também chamado jalamandala (porque seu elemento é jala
= água) e medhradhāra (medhra=pênis),
está situado na base do órgão gerador masculino (plexo do sacro). Tem forma de
lótus com seis pétalas de cor vermelho-alaranjado, onde estão inscritas as
letras b, bh, m, r; l e y. No centro do lótus há uma meia-lua
branca que tem relaçāo mística com Varuna. No meio da lua, um bija-mantra em
cujo centro está Visnu flanqueado pela deusa Sākinī (segundo a Śiva-samhitā,
V,99, trata-se de Rākinī). O
svādhisthāna-cakra está relacionado com o elemento água, a cor branca, a respiração
prāna, o sentido do gosto, a mão
etc.
3º)
Manipūra (mani = jóias; pūra = cidade) ou nābhisthāna (nābhi= umbigo), situado na região lombar na altura do
umbigo (plexo epigástrico), tem forma de lótus azul com dez pétalas e as letras
d, dh,n, t, th, d, dh, n, p, ph. No
meio do lótus há um triângulo vermelho e sobre o triângulo o deus Mahārudra, sentado sobre um touro, tem
ao seu lado Lākinī Śakti, de cor azulada. Este
cakra relaciona-se com o elemento fogo, o Sol, o rajas (fluido menstrual), a respiração
samāna, o sentido da visão etc.
4º)
Anāhata (anāhata
s’abd é o som que produzem, sem se tocarem, dois objetos, isto é, “um som
místico"); está na região do coração, sede do prāna e do jivātman. De
cor vermelha, tem forma de lótus com doze pétalas douradas (onde estão
inscritas as letras k, kh, g, gh
etc.). No meio do lótus há dois triângulos dispostos em forma de “selo de Salomão”,
cor de fumaça, no centro do qual se acha outro triângulo dourado contendo um
linga brilhante. Acima dos dois triângulos está Īśvara associado à Śakti
Kākinī (de cor vermelha). Esse
chacra está relacionado com o elemento ar, o sentido do tato, o falo, a forca
motriz, o sistema sanguíneo, etc.
5º)
Visuddha (o cakra da pureza)
está na região da garganta, (plexo laríngeo e faríngeo, na junção da espinha
dorsal com o bulbo raquidiano), sede da respiração udāna e do bindu. Tem
forma de lótus de dezesseis pétalas de cor vermelho-acinzentado (com as letras a, ā, i, u, ù etc.). No interior do
lótus, um espaço azul, símbolo do elemento ākāsa (éter, espaço), tem no meio um
círculo branco contendo um elefante. Sobre o elefante repousa um bija-mantra (hang) sustentando Sadāśiva,
metade prata, metade ouro, pois o deus está representado em seu aspecto
andrógino (ardhanārisvara). Sentado
em um touro, tem em suas numerosas mãos uma enorme quantidade de objetos e
emblemas que lhe são característicos (vajra,
tridente, sino etc.). Metade de seu corpo constitui a Sadā Gaurī, com dez braços, cinco faces (cada uma com três olhos). Este cakra está relacionado com a cor
branca, o elemento éter (ākāsa), o
sentido da audição, a pele, etc.
6º)
Ajnā (ordem,
comando), este cakra está situado entre as sobrancelhas (plexo cavernoso). Tem
forma de lótus branco com duas pétalas onde estão inscritas as letras h e ks’.
É a sede das faculdades cognitivas: buddhi, ahamkāra, manas e os indriya (sentidos)
em sua modalidade sutil. No lótus há um triângulo branco com o vértice
invertido (símbolo da yoni); no meio
do triângulo, um linga igualmente branco chamado itara (o "outro"). Aqui fica a sede de Paramaśiva. O bija-mantra é OM. A deusa tutelar é Hākini: ela tem seis rostos e seis
braços e está sentada em um lótus branco.
7º) Sahasrāra-cakra.
Localizado no topo da cabeça, sua forma é a de lótus virado para baixo,
com mil pétalas (sahasra = mil). Também chamado brahmasthāna, brahmarandhra, nirvāna-cakra etc., suas pétalas
exibem todas as articulações possíveis do alfabeto sânscrito, que tem 50 letras
(50 x 20). No meio do lótus acha-se a lua cheia que encerra um triângulo; aí se
experiencia a uniāo final (unmani) de
Śiva e Śakti, finalidade do sādhana
tântrico; aí também desemboca a kundalini
depois de ter perpassado os seis cakra inferiores. É necessário notar que o sahasrāra-cakra
não pertence ao nível do corpo, ele já designa o plano transcendente - isso
explica por que se fala geralmente da doutrina dos "seis cakra".
[ Muitas vezes um esquema
mitológico é interiorizado e encarnado, utilizando-se a teoria tântrica dos
cakra. No poema vixnuíta intitulado Brahma-samhitā
o sahasrāra-cakra é assimilado a Gokula,
morada de Krsna ] p.222
Existem outros cakra menos
importantes. Assim, entre o mūlādhāra
e o svādhisthāna acha-se o yonisthāna, lugar de reunião de Śiva e Śakti, lugar de beatitude, também chamado (como o próprio mūlādhāra) kāmarūpa, isto é, desejo e forma. É a fonte do desejo e, em nível
carnal, uma antecipação da união Śiva-Śakti,
que se completa no sahasrāra. Perto
do ājñā-cakra acham-se o manas-cakra e o soma-cakra, relacionados com as funções intelectivas e certas
experiências yóguicas. Perto ainda do ājñā-cakra
existe também o kārana-rūpa, sede das
sete formas causais, consideradas produtoras e constituintes do corpo sutil e
do corpo físico. Enfim, outros textos falam de certo número de ādhāra (suportes, receptáculos),
situados entre os cakra ou identificados com eles.
Na tradição hesicasta (de oração solitária) distinguiu-se
segundo certos autores, quatro “centros” de meditação e prece: 1º centro
craniano cérebro-frontal (localizado na região entre as sobrancelhas); 2º)
centro buco-laríngeo (correspondente ao
“pensamento mais comum: o da inteligência que se expressa na conversação, na
correspondência e nos primeiros estágios da oração”, A Bloom); 3º) centro
peitoral (“situado na parte superior e média do peito”. A estabilidade do
pensamento, já colorido por um elemento tímico, é muito maior nos casos
anteriores, mas é ainda o pensamento que define a coloração emocional e que é
modificado por ela” A. Bloom); 4º) centro cardíaco (situado “na parte superior
do coração, um pouco abaixo da mama esquerda”, segundo os Padres gregos “um
pouco acima”, segundo Theophane, o Recluso e outros “É o local físico da atenção
perfeita”; Antoine Bloom (L’ hesychasme, Yoga Chrétien? p.185)
Os tantras budistas admitem
somente quatro cakra, situados respectivamente nas regiões umbilical, cardíaca,
laríngea e cerebral. Este último, o mais importante, chama-se usnisa-kamalā (lótus da cabeça) e
corresponde ao sahasrāra dos hindus.
Nos três cakra inferiores estão localizados os três kāya (corpos): nirmāna-kāya
no cakra umbilical, dharma-kāya no
cakra do coração e sambhoga-kāya no
cakra da garganta. Porém, observam-se anomalias e contradições relativas ao
número e localização desses cakra (ver Dasgupta,
An Introduction to Tantric Buddhism, p.163 e ss.). Da mesma forma que nas
tradições hindus, os cakra sāo associados às mudrā e às deusas, neste caso: Locanā,
Māmaki, Pāndarā e Tārā (Sri-samputikā, citado por Dasgupta, op. cit., p. 165). O Hevajra-tantra oferece uma longa lista
de "quaternidades" relacionadas com os quatro cakra: quatro tattva, quatro anga, quatro momentos, quatro nobres verdades (ārya-sattva) etc. (ib., pp. 166-167)
Vistos em projeção, os cakra
constituem um mandala cujo cento é
marcado pelo brahmarandhra. É nesse
centro que tem lugar a ruptura de nível, onde se efetua o ato paradoxal da
transcendência, a superação do samsāra e
a "saída do Tempo". O simbolismo do mandala é igualmente constitutivo
dos templos e de toda construção sagrada indiana: visto em projeção, um templo
é um mandala. Pode-se então dizer que toda circum-ambulação equivale a uma
marcha de aproximação ao Centro, e que a entrada em um templo repete a inserçāo
iniciática em um mandala ou a passagem da kundalini
através dos cakra. Além disso, o
corpo é transformado, ao mesmo tempo, em microcosmos (com o monte Meru como centro) e em panteão, cada região
e cada órgão sutil com sua divindade tutelar, seu mantra, sua letra mística
etc. O discípulo não apenas se identifica com o cosmos, mas também chega a
redescobrir em seu corpo a gênese e a destruiçāo dos universos. Como veremos, o
sādhana compreende duas etapas: 1°) a
"cosmizacão" do ser humano; 2°) a "transcendência" do
cosmos, isto é, sua "destruição” pela unificação dos contrários (Sol, Lua
etc.). O sinal por excelência da transcendência é constituído pelo ato final da
ascensão da kundalini: sua união com Śiva, no topo da caixa craniana, no sahasrāra.
KUNDALINI
Já mostramos vários aspectos
da kundalini, ora descrita como
serpente, ora como deusa ou energia. O Hatha-yoga-pradipikā,
III, 9, apresenta-a como "Kutilāngi (a do corpo torcido), Kundalinī, Bhujangī (serpente fêmea), Sakti, Iśvarī, Kundalī, Arundhatī,
termos todos equivalentes. Da mesma
forma que se abre uma porta com uma chave, o yogin abre a porta da liberação (mukti) libertando a kundalini mediante o
hatha-yoga" (cf. Goraksa
Sataka,51). Quando a Deusa adormecida é acordada pela graça do guru todos os
cakra são rapidamente atravessados (Siva-samhitā,IV, 12-14;
Hatha-yoga-pradipikā,III,1 e ss.). Identificada com Śabdabrahman ,isto é,com o mantra OM, a kundalini acumula os
atributos de todos os deuses e todas as deusas (Saradā-tilaka-tantra, I, 14,55;XXV,6 e ss.).
p. 202-205; 337
CONCENTRAÇĀO
(DHĀRANĀ)
A concentração (dhāranā, da raiz dhr, conservar fechado)
é na realidade a fixação em um único ponto, mas cujo conteúdo é estritamente
conceitual. Em outras palavras dhāranā,
objetiva deter o fluxo psicomental e fixa-lo em um único ponto – realiza essa fixação,
a fim de compreender. Na definição de Patañjali, ela é a fixação do pensamento
em um único ponto (Yoga Sutra III, 1 ). Vyāsa indica com precisão que a concentração
se dá geralmente no centro (cakra) do umbigo, no lótus do coração, na luz da
cabeça, na ponta do nariz, na ponta da língua ou em um lugar ou objeto exterior
(Yoga Sutra III, 1). Vācaspati Mis’ra acrescenta que não se pode obter a dhāranā, sem a ajuda de um objeto ao
qual se fixe o pensamento.
Comentando o Yoga Sutra III, 1
Vyāsa já falava da concentraçāo no “lótus do coração”. Esta experiência já é
encontrada nas Upanisad, sempre relacionada com o encontro com o próprio Si (atman). A luz “do coraçāo”, terá um
destino excepcional em todos os métodos místicos indianos pós-Upanisad. A
propósito desse texto de Vyāsa,Vācaspati Miśra descreve longamente o lótus do coração:
ele tem oito pétalas e se situa de cabeça para baixo, entre o abdome e o peito;
é necessário inverter sua posição, retendo a respiração (recaka) e concentrando
nele a mente (citta). No centro do lótus
encontram-se o disco solar e a letra A; ali é a sede do estado de vigília. Acima encontramos o disco lunar com a
letra U; é a sede do sono. Mais acima
ainda está o “círculo do fogo”com a letra M, sede do sono profundo. Enfim, acima deste último, encontra-se o “círculo
mais alto, cuja essência é o ar”, sede
do quarto estado (“estado cataléptico”). Nesse último lótus, mais
exatamente em seu pericarpo, situa-se o ”nervo (nādi) de Brahman”, orientado para o alto e desembocando no círculo do Sol e
nos demais círculos: aqui começa a nādi
chamada susumnā, que também atravessa
os círculos exteriores. Aqui é a sede de citta; concentrando-se nesse preciso
ponto o yogin obtém a consciência de citta
(em outros termos, toma consciência da
consciência). ...
O importante é deixar claro
desde já que a tradição do Yoga clássico, representada por Patañjali, conheceu
e usou os esquemas da “fisiologia mística”; chamada a desempenhar um papel
importante na história da espiritualidade indiana. ...
p.71-72
ELIADE, Mircea. Yoga,
imortalidade e liberdade. SP: Palas Atenas, 1996
Outras referências
SVOBODA, Robert; LADE, Arnie.
Tao e Dharma. SP: Editora Pensamento, 1995
STUX, Gabriel. Chakra
acupuncture.Medical Acupuncture, 1994 Volume6/ Nº1
http://www.medicalacupuncture.org
TESTUT, L.; LATARJET, A.
Tratado de anatomia humana Tomo III). Barcelona: Salvat Ed. 1983
...................................
Ilustraçāo: Chakra
positions in relation to nervous plexi.
C. W. Leadbeater (1847-1934).
The book "The Chakras, 1927
....................
VER TAMBÉM
GABRIEL STUX, M.D. / Tradução: Paulo Pedro P.R. Costa, 2013
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